A última manifestação popular feita no Brasil foi convocada com menos de 24 horas de antecedência. E foi uma manifestação significativa, embora a maioria das análises posteriores tenham insistido em ignorar que tenha ocorrido.
Na segunda feira, dia 9 de janeiro, em dezenas de cidades brasileiras, milhares de pessoas foram às ruas protestar contra a tentativa de golpe realizada pela extrema direita na tarde do dia anterior, 8 de janeiro, um domingo. Na maioria destas dezenas de cidades, a decisão por fazer a manifestação ocorreu no mesmo dia. Portanto, tivemos manifestações expressivas que foram convocadas algumas horas antes da sua realização. "Sem anistia" foi a palavra de ordem mais ouvida nas ruas, uma forma de manifestar o desejo popular de que todos os golpistas sejam punidos. Este fato deveria ser comemorado por todo o campo popular e por todas as autoridades do novo governo!
Mas parece que a maior parte do chamado campo democrático e popular, especialmente as direções das maiores organizações de massa, estão optando por deixar a disputa apenas no campo institucional. E tem até argumentos neste sentido, afirmando que: não podemos partir para o revanchismo; não podemos criar uma polarização nas ruas porque isso poderia dar pretexto para as forças armadas darem golpe; a extrema direita está armada e nós não, de sorte que seríamos massacrados; devemos confiar na capacidade de enfrentamento feito pelas instâncias do Estado; ...
É fato que autoridades do governo Lula e o próprio presidente têm tomado decisões importantes desde a tarde do dia 8 de janeiro. Tais decisões têm sido objeto de debate por diversos analistas e por milhares de militantes, uns apontando que são medidas insuficientes, outros exaltando o sucesso do enfrentamento ao golpe. Essa profusão de debates é unânime em afirmar que houve conivência ou mesmo participação ativa de policiais e de militares nas ações golpistas. As divergências aparecem quando se trata de opinar sobre qual o remédio eficaz para extinguir o risco de golpe, ou como acabar com a tutela militar secular em nosso país.
Todo este debate tem a sua importância, trás mais conhecimento e aprofunda entre a militância a reflexão sobre os problemas nacionais. Ajuda a constituir uma solidez maior de análise nos setores de esquerda, e, portanto, é também uma prática importante para o presente e para o futuro.
Mas é preciso registrar que todo este debate não tem abordado justamente o campo de atuação das forças populares: a importância de organizar e mobilizar a classe trabalhadora e todos os demais setores oprimidos para fazer frente à difícil conjuntura nacional.
Algumas autoridades dos poderes constituídos têm tomado decisões importantes e fortes, e sempre que for o caso, devemos aplaudir e apoiar. Mas um governo popular não se assegura por muito tempo e nem leva adiante uma política de ampliação dos direitos apenas com decisões palacianas, e todos os golpes já feitos pela direita em nosso país confirmam isso.
O principal general que podemos ter para enfrentar o golpe e os ataques da extrema direita é a organização e a mobilização popular. O trabalho permanente de disputa da opinião, de convencimento e de conscientização depende do esforço tático de mobilização para objetivos políticos claros. A melhor forma de convencer mais gente a se posicionar contra o golpe é o esforço para mobilizar contra o golpe.
Não se trata de revanchismo, nem de provocar a extrema direita, até porque o fascismo não precisa ser provocado para atacar, como, aliás, temos visto em abundância. E também não estamos chamando ninguém para a luta armada, eles é que têm nos ameaçado e agredido há tempos. Trata-se de dizer que nós não temos medo deles, trata-se de expressar nas ruas que somos de fato a maioria.
O processo de transformação social necessário para acabar com as injustiças em nosso país depende da soberania e do exercício do poder popular, e isso não sairá dos gabinetes, embora os gabinetes sejam importantes como instrumento e como suporte para as lutas populares. Só haverá emancipação do povo trabalhador brasileiro, só haverá justiça social se o povo se constituir como seu próprio general.
Não estamos defendendo uma tática espontânea e anárquica, e sim reiterando que o projeto popular só se mantém de pé se for permanentemente assegurado pela força da mobilização popular. A esquerda não pode negligenciar que a força das ruas é a principal ferramenta que um projeto popular pode ter enquanto não tiver seu próprio exército. Para assegurar condições de colocar em movimento a resistência popular de massas, as organizações populares e os amplos setores que defendem a democracia precisam se organizar em comitês permanentes contra o golpe. A defesa efetiva do governo e o avanço do projeto popular depende desta articulação política e orgânica.
Janeiro de 2023
DIREÇÃO NACIONAL - INICIATIVA COMUNISTA